“Aldeia das Águias”
Quando o tempo mostrava carantonhas de temporal, das
cavernas da fraga imensa saíam gritos de águias, álgidos e demorados,
trespassando a névoa húmida e fazendo tremer de medo os serranos que viviam nas
proximidades; e se o sol esbanjava sua fortuna de luminosidade, como agora, dos
buracos numerosos no peito plúmbeo do fraguedo, partiam e chegavam as aves de
rapina, batendo asas em voos canseirosos na conquista do
espaço.
Como aparecesse de verdadeiro milagre, quente e
luminoso, o dia de S. João, data tradicional que os paroquianos de Vinhós
marcavam para dar caça às águias, seguia pelos carreiros que ladeavam a Fraga
da Ermida um povoléu de centenas de mafarricos, cantando e gritando numa
volúpia quase selvagem.
A festa da morte das devoradoras de rebanhos, havia
atraído, como sempre, gente dos pontos mais afastados, de muito mais longe
mesmo que das incontáveis aldeias que espreitavam nos quintos das lonjuras
nevoentas.
Até onde os olhos abrangiam, certamente que se não
realizava festança tão acesa de entusiasmo como a que ali se consagrava às
inimigas dos pastores e dos rebanhos. Desde muito cedo, até para
além do meio-dia, fora um nunca acabar de gente, a maior parte a pé, muita
outra escarranchada em albardas, trepa que trepa os carreiros pedregosos,
subindo para a planura onde, havia decénios, se realizava essa romaria de
demência e de morte.
Milhares de criaturas, correndo todas as idades,
espalhavam-se agora sobre a terra almofadada de erva, que se deixava calcar
humildemente. Faziam-se e desfaziam-se bailaricos, assim como se enchiam e
esvaziavam cabaças de vinho, que o sol de Junho marchava aberto no seu peso de
calor. Antes da caça principiar, festejavam-se assim, em rubros gestos de
folia, a perícia dos caçadores, que passavam de escopeta ao ombro, e a força
dos moços da corda e cesto, pimpões e hercúleos, que não tardariam a mostrar
quanto valiam os seus braços. Estes eram os heróis do dia, que davam extensão
às conversas, faziam rodopiar as raparigas, e despejavam pipos de briol,
preparando embriaguez que, dentro em pouco, seria louca trovoada de
gritos e de tiros de pederneira.
Entre os poucos que se calavam contavam-se os cegos
que tinham vindo para pedinchar e que, ajoelhados, de mãos estendidas, ficavam por vezes a adivinhar o
céu, onde voavam as águias que iam ser sacrificadas».
A Fraga da Ermida, beleza inspiradora de
romancistas, pintores e pensadores.
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ares agitados em borborinho dali as aguias faziam seu ninho....
ResponderEliminarqu e que ficou...
mascotte do benfica... nao se admirem que as aguias voaram pra mais alto.